Sem sentido
Tem tempo que por mais que a gente insista em tentar fazer as coisas da maneira aparentemente melhor, mais saúdavel, tudo começa a não fazer mais sentido; nem a chuva, nem as águas, são capazes de levar pra longe o mar de angústias, de vazios, de desamores, de desafetos, de solidão que a cada instante se solidifica cicatrizando imagens que não agrada aos olhos, aos olfatos, aos gostos. O sabor amargo de uma taça jamais tocada, vivênciada, de um vinho tinto velho de muito anos, de muito tempos, de outros tempos. Uma foto antiga borrada com tinta escura desconstrói a história que não teve inicio, meio e que sobrevive de finais. Finais de festas, de feiras, de filmes, de contos, de livros, de viagens, de amores nunca vivido. Não resta da sopa quente nem o gostinho do abraço apertado nem do beijo no canto do rosto. Felizes não são os finais, e os começos nem sempre iniciam histórias que se escrevem nas areias do tempo, do pensamento, de um sopro. Pessoas enfileiradas se espremem sufocadas dentro de uma boca fechada guardada numa caixinha, dentro de uma gaveta trancada num criado mudo velho, ao lado da cama.
Lá fora ouve-se os gritos de gente, de uma terra nunca habitada, de palavras estranhas e perdidas. Amontoados os sentimentos tentam se organizar num frenesi discreto. Certeza tem a lua, que teima em se colocar atrevidamente, de tempo em tempo, mesmo com toda sua inconstância.
Adrianno Rodrigues


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